Oitava Confissão

Confissões

No meu Cacha Pregos, no meio da tarde, pensando no meu meio de vida, a minha memória me levou para 1984. Eu estava aqui também, em Cacha Pregos, esperando o pôr do sol. Lembro-me de ver a noite caindo. Discutia com um amigo que insistia em dizer que quando o sol se põe quem cai é o dia. O momento precisava da discussão. De fato pouco importa quem substitui quem, mas por toda a situação precisávamos filosofar sobre o mergulho do sol ou o cair da lua.

A noite chegou como esperávamos, trazendo a lua cheia, abastecendo meu fascínio em observar e participar do movimento dos astros.

Lembro-me que ele foi embora e eu fiquei na praia esperando pelo rastro que a lua deixa no mar.

Neste dia vi, pela primeira vez, o canal transportador das Casas Astrais.

A praia deserta, a areia mais branca do que nunca clareada pela lua. De repente, um foco de luz em um tom verde, como se alguém houvesse acendido uma luz das nuvens, porém não havia nuvens.

Fiquei olhando, procurando entender o que estava vendo. O mar também clareado pela lua mostrava que não havia barco, nenhuma lanterna, nada, ninguém. Como era possível aquele foco de luz sobre a areia? E não desaparecia, mantinha-se firme, quase como uma pintura. Levantei e me aproximei. Na medida em que andava o foco caminhava também. Resolvi correr, surpreendê-lo. Sem êxito!

Olhei para o céu tentando encontrar uma origem, uma explicação. Nada me foi dito. Resolvi olhar as horas, eram exatamente 21h12min e o foco ali ficou por mais dez minutos. Não sumiu simplesmente, foi subindo, subindo, devagar, sem pressa até se extinguir. O que era aquilo? Eu não sabia.

Estava sozinha em casa. Dividir o quê? Com quem? Ansiosamente pensei em telefonar. Não telefonei para ninguém, já sabia o que iria ouvir. Esta época foi bem difícil.

Meus amigos passavam dias e dias comigo, perscrutando minha rotina e somente muito tempo depois soube, por eles mesmos, que a investigação tinha a ver com a suspeita de uso de drogas. Alguns dos meus amigos tinham experiência com maconha e LSD e diziam que viam coisas, alucinações…

Eu tomava uma cerveja de vez em quando, mas este dia havia passado na praia, pescando. Pescava siri com as marisqueiras (mulheres que pescam mariscos) para vender para os restaurantes da Ilha. Assim podia me manter no meu autoexílio.  Quando sai da casa do meu Pai Nelito era o único lugar que poderia estar para digerir o conhecimento e sobreviver as experiências inusitadas, como esta que acabei de narrar.

Um amigo espiritual que me orientava nada esclarecia. Eu precisava descobrir tudo sozinha. Ele me dizia que as experiências eram minhas, intransferíveis, que não procurasse parâmetro e similaridade na experiência de outras pessoas. Parâmetros são traduções. Que não buscasse me traduzir por tradutores alheios ao que eu estava vivenciando. Era importante que eu encontrasse a minha tradução, o meu entendimento.

Vinte e sete anos se passaram desde então e minha memória volta ao dia de hoje. Cacha Pregos continua o mesmo lugar, a ponta da Ilha de Itaparica, uma colônia de pescadores com praias desertas, lindas. Um verdadeiro santuário da natureza. Mas eu estou muito diferente.

Hoje é dia 16 de setembro de 2014, estou aguardando um grupo de pessoas que virá de outros estados do Brasil, de outro país para fazer um trabalho comigo. Repetirei para elas o que ouvi do meu amigo espiritual:

Fique com a sua experiência, encontre o entendimento, compreenda o que e como as energias da natureza lhe acessam. Permita que o seu inconsciente se apresente para a sua consciência. Não busque em mim traduções para as suas vivencias porque, se assim o fizer, trairá a sua alma e encerrará a emancipação da sua consciência. Vou estar aqui, ao seu lado, amparando-te para o que der e vier.

Precisa ser assim, não podemos mais trocar o religare por religiões. Precisamos parar de depender do aval dos lideres religiosos.

Precisamos parar de ser reféns da interpretação, da tradução, dos diagnósticos para, com naturalidade, descobrir o quanto percebemos da realidade.

A lucidez se encontra assim, os tropeços e as dúvidas servem como bengala para nos erguermos quando tudo está forte demais.

É assim que faço até os dias de hoje quando vivo uma experiência inusitada. Primeiro ela cala o meu fluxo. Se a dúvida me visita caminho por ela. A dúvida real é o porto seguro que comanda as nossas necessidades e capacidade de compreensão.

Na dúvida a pressa desaparece, ganha-se tempo porque se caminha mais devagar, mas cada passo é real. A dúvida não busca a verdade dos outros, a dúvida sequer busca a verdade, a dúvida verdadeira nos conduz para a realidade.

A realidade é um braço de mar nos oceanos das verdades e, neste braço de mar, assenhoreamo-nos das águas pelo íntimo contato, pelo abraço cósmico que culmina no encontro entre um pequeno ser e uma infinita explanação de verdades.

O pequeno ser se sente abraçado, acolhido e é o mais importante, neste momento, não ser abraçado; é abraçar, é sentir as mãos abrigando a realidade. Esta sensação confirma a veracidade do que estamos vivendo, aprendendo e encontrando e, assim, a consciência se amplia.

Um braço de mar em cada experiência. Se trouxermos dali um grão de areia, todo o conhecimento cósmico estará inserido neste grão.

As palavras são construídas por letras. As letras por riscos e o risco, quando começa a escrever a letra, já sabe o que quer dizer através das palavras.

Cada experiência risca uma letra. O importante é manter o foco no risco senão o abandonamos e vamos ler palavras que não conhecemos o risco.

Se você quer escrever uma palavra use o seu risco, com ele você escreverá o que quiser.

Foi isto o que aprendi quando parei de comparar a minha experiência com a de outras pessoas. Cada experiência nova que vivo já não me assusta porque tenho a possibilidade de riscar palavras que me farão entender e compreender o que vivenciei.

Cacha Pregos, final de tarde. Que venha a lua, que venha a noite e, junto com ela, o foco de luz já tão meu amigo, tão íntimo, o meu elevador colorido que conduz uma parte de mim para outras dimensões.

Com carinho por todos

Halu Gamashi
16.set.2014

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